sexta-feira, 21 de agosto de 2009

O PRETEXTO DA FUNDAÇÃO DE SÃO PAULO E AS RIQUEZAS DA AMÉRICA


FUNDAÇÃO DE SÃO PAULO E AS RIQUEZAS DA AMÉRICA



A historiografia determinante pelo poder define como sendo a cidade São Paulo “fundada” em terras do interior do Brasil, em 25 de janeiro de 1554, no Pátio do Colégio, pelos padres Manoel da Nóbrega e José de Anchieta, este espanhol de Tenerife, nas Ilhas Canárias, possessão de Espanha, em uma colina de que os nativos da terra denominavam Piratininga e tinham suas estruturas dirigidas por Tibiriçá , o “Vigilante da Terra”.


Havia uma mobilidade deste povo nativo com deslocamentos constantes das aldeias. Foram estes que erigiram a primeira fundação no topo do Planalto Paulista antes do “Achamento” europeu, com três aldeias relevantes localizadas no que depois se denominou sendo o centro de São Paulo, embora Anchieta cite em documentos da Ordem jesuíta ser as mesmas um total de doze, às margens da fertilidade de rios, riachos e lagoas. Essas três principais aldeias eram Inhapambuçu, em tupi, “morro do alto do qual tudo se vê”, próximo onde hoje se localiza o mosteiro de São Bento e aldeia de Tibiriçá; Jeribatuba,“lugar de muitos jerivás”, uma palmeira alta de coquinhos adocicados, que era chefiada por Caiubi, irmão de Tibiriçá e Bartira que se casou com o português João Ramalho, fixou aldeia na margem direita do rio Pinheiros, e Ibirapuera “lugar que antes era mato”, também erguida às margens do Pinheiros, área representada pelo  atual bairro de Santo Amaro; Ururaí, “rio dos jacarés”, aldeia de Piquerobi, também irmão de Tibiriçá, hoje São Miguel Paulista.

Em janeiro de 1554, Nóbrega, acompanhado de 12 padres e irmãos subiram a Serra do Mar, a muralha vencida, fixando-se no planalto interiorano, após ter rezado uma missa no local o nome indígena Piratininga, “lugar onde se seca o peixe”, foi substituído pelo nome de São Paulo, santo cristão comemorado em 25 de janeiro, dia escolhido para celebrar a primeira missa do planalto, já que discípulo Paulo foi o “apóstolo dos gentios”, os “estranhos”, aqueles que desconheciam a fé, distanciados, que em latim denominou-se chamar “pagani”, ou seja, os mais afastados. O lugar eleito já concentrava, conforme a crônica da época, presença de autóctones com estrutura própria em um lugar estratégico, localizado no topo de uma colina entre os vales de dois rios, o lento e sinuoso Tamanduateí e o outro num vale, o Anhangabaú, local este em forma triangular, perfeito para a defesa de possíveis ataques, com ampla vista dos campos, as várzeas e planícies. O “apoderamento da terra” dava início através do modelo catequético orientado pela Coroa portuguesa e a Igreja.

Tem-se uma colocação feita pelo professor Pasquale Petrone, que deixa definida a intenção:

“É importante ressaltar que os aldeamentos eram formas forçadas de organização da população indígena e tinham duas administrações. Uma jesuítica, onde se dava privilégio para a catequização dos índios e para uso de sua mão de obra para a produção de alimentos consumidos no próprio aldeamento. Neste caso os aldeamentos constituíam-se em terras de propriedade dos jesuítas. Um segundo tipo era o pertencente a terras não jesuíticas onde os índios eram tanto agricultores como escravos. Neste caso eram escravizados por civis”.

"Quando os jesuítas fundaram São Paulo em torno da promissora Piratininga, como bastiões da conquista do planalto, outras povoações foram sendo implantadas. Formavam sem dúvida um cinturão jesuítico defensivo e de penetração, mui além das roças de Jeribatiba, as povoações de Itaquaquecetuba, Carapicuíba, Itapecerica, M'boy. Era amplo esse cinturão jesuítico, pois Nóbrega, solicitado pelos nativos, penetrou quarenta léguas de Piratininga e formou uma pequena redução ao redor de uma capela na aldeia dos carijós, na Japuíba ou Maniçoba" - ARAÚJO, Alceu Maynard - in "Dança da Santa Cruz". Jornal Correio Paulistano. São Paulo /Br. [12.02.1920, 3º Caderno, p.10].

Ressalte que havia também a formação de aldeias próximas deste cinturão protetor e que fazia parte de um sistema de aldeias bem definidas, e que os fomentados aldeamentos missionários foram apossando-se das terras em volta de modo a fortalecer o que seria mais tarde a cidade de São Paulo. Já existia a aldeia de Itapecerica da Serra ou como denominavam os naturais TAPIIPISSAPÉ do Guarani, Tapii; Anta + pysape; Unha dos Pés, que seria definido como Unha de Anta, representação das marcas deixadas pelo animal no terreno, acusando sua presença. Referindo-se a um lugar como Aldeia da Unha de Anta ou Aldeia de Tapiipissapé, que os padres jesuítas alteraram para Itapeerica, nitida adaptação aos nomes nativos tupis e guaranis para uma linguagem mais perto dos dominadores portugueses, ou dando nome de santos católicos ou interpretações indiciando a natureza geográfica: Itapecerica, Ita; Pedra + Peerica; Pontiaguda. O padre Anchieta, na sua carta de 1584, sobre "Informação do Brasil e de suas Capitanias", observa que "...suas antas chamam tapiîretê...", animais da família tapirus terrestris, que abundam nas aldeias da boca-do-sertão, e que dão nome Tapiipissapé.

Itaquaquecetuba, outra localidade do cinturão, era proveniente de um aldeamento de índios guaianá, oriundos de Carapicuíba e Guarapiranga, e que de lá saíram por motivos inerentes ao modelo do deslocamento natural. Afirma-se que os índios guaianá são guarani, e o termo significa manso, pacato, ingênuo. Num aldeamento havia elementos de diversas tribos heterogêneas, mas com costumes semelhantes. (Araújo, Alceu Maynard. "Dança da Santa Cruz". Correio Paulistano. São Paulo, 12 de fevereiro de 1920, 3º caderno, p.10)


No planalto da Serra do Mar e nos sertões próximos, incluindo a estrada indígena Peabiru, de controle jesuítico, que curiosamente ligava aos antigos caminhos incas em território espanhol despertava interesses maiores que uma simples manutenção de aldeamento indígena. Enquanto isso, entre aldeias como Mbarueri, Pinheiros, Arassaryguana, Koty, Itapeerica ou Tapiissapé, os padres da Sociedade Jesuítica preparavam ultrapassar o longo caminho de Peabiru para o sul da Linha de Tordesilhas e ao alcance da Coroa castelhana. Percebendo que Portugal seria incorporado por Castela em breve pelos acontecimentos entre as linhagens ibéricas e falta de sucessão na Coroa lusa, penetram além dos limites do Tratado de Tordesilhas, talvez com idéia de criar um território independente das duas coroas. Se a preocupação dos padres e confrades jesuítas, nada tem a ver com a Nação portuguesa, mas com a Coroa bragantina e os desígnios do Papado romano-católico, as epístolas das pregações são marcos histórico na definição da ocupação luso-vaticana a levar a cabo na terra sem mal, ou “ivy marã ey”. Deste modo já antes de chegar a São Vicente, o padre Manoel da Nóbrega havia determinado conhecer os caminhos do sul, a meta principal dos interesses maiores das ações da sociedade jesuítica é a expansão espacial, ocupação de terras da Espanha. O padre Serafim Leite, na sua compilação de estudos sobre os eventos jesuítas no Brasil, é muito claro: "São Paulo de Piratininga e Maniçoba, marcos avançados, postos no interior, a caminho do Paraguay". Sabe-se que o importante não era a fundação de São Paulo dos Campos de Piratininga, o importante eram as terras guaranis ao sul e além do Tratado de Tordesilhas, para o importante Rio da Prata, que trouxe para o sul a expedição exploradora de Martim Afonso de Souza, recebendo este comandante junto com o irmão Pero Lopes de Souza as capitanias do extremo sul, regiões de Caraguatatuba, Bertioga e Cananéia, buscando se inteirar de importante saída para o mar pelos de Espanha no estuário do Rio da Prata.
As bandeiras e as expedições dos padres que iam ao interior catequizar os índios não respeitaram o que estava estabelecido no Tratado de Tordesilhas; terras, que eram espanholas, foram ocupadas e percorridas por expedições que partiam do Brasil. Permitiu até, o governo português, que colonos do sul do Brasil fundassem a Colônia do Sacramento, em 1680, à margem esquerda do Rio da Prata, em pleno território espanhol, e onde se localiza hoje a República Oriental do Uruguai, recuperada pela Espanha somente com Assinatura do Tratado de Santo Ildefonso em outubro de 1777 com Vantagens para a Espanha no Sul: posse espanhola da Colônia do Sacramento e Sete Povos do Uruguai. E enquanto nas regiões de mineração, como Arassaryguana, os jesuítas estabeleciam fazendas próprias, porque os minérios que também tinham importância como lastro econômico direcionado ao império jesuítico a ser iniciado no sul do Brasil, os colonos estabeleceram ainda, na sua fase inicial de fixação, grandes núcleos agro-pecuários que produziam e abasteciam de alimentos. Assim, crescem as aldeias nativas, tomadas pelos colonos portugueses de atividade econômica agrícola e mineradora, tornando-se a Vila de São Paulo dos Campos de Piratininga, o marco Imperial Luso-Vaticano da Serra do Mar.


Interesses mercantis estavam acima dos interesses de povoamento, mas precisam se estabilizar nas fazendas ricas em sesmarias além da serra e já no coração do sertão do planalto. As terras do Sul pelo Caminho de Peabiru para atingir os "cerros" de prata, que penetrava nos atuais estados de São Paulo, Paraná, Paraguai, Bolívia e Peru, locais de onde saiam às riquezas de Espanha. Este é o primordial interesse da presença da ordem jesuítica sem levantar suspeitas da real intenção da metrópole portuguesa mancomunado com os interesses da Igreja.

Para defenderem a Vila de Piratininga vão buscar nativos entre as doze aldeias da boca de sertão pelos caminhos de Peabiru, com ajuda direta de colonos e sesmeiros, bandeirantes e mineradores, como Dias Paes e os irmãos Sardinha que possuíam terras a perder de vista, sendo donos da primeira mina de ouro encontrada no planalto paulistanos caminhos de Carapicuíba, no pico do Jaraguá, arregimentando milhares de “peças das suas escravarias”, como se chamavam a mão de obra, geralmente índios cerceados de sua liberdade denominados “negros da terra”, caçados nas matas por consentimento das “guerras justas”, preados consentidos através de decreto.

Pelo direito privado romano do “uti possidetis, ita possideatis”, quem possui de fato, deve possuir de direito, assumia proporções maiores do que as definidas pelo Tratado inicial entre Castela e Portugal.
A fundação de São Paulo foi o maior pretexto para atingir as terras ricas da América!

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