quinta-feira, 6 de novembro de 2014

A "Fundição Sarraceno" da Escócia e a "Estação da Luz" de São Paulo, Brasil

Símbolo das mudanças do encontro dos séculos 19 e 20
A “Fundição Sarraceno” (Saracen Foundry) era conhecida também por Possilpark, situada em Glasgow, era à base da fundição da companhia Walter MacFarlane & Co. Ltd, fundada por Walter MacFarlane, sendo o mais importante fabricante de indústria siderúrgica decorativa na Escócia.
Walter MacFarlane I nasceu em Torrance de Campsie, perto de Glasgow em 1817. Ele trabalhou para o joalheiro William Russell, antes de servir como aprendiz com o ferreiro James Buchanan. Trabalhou por uma década Moses na Fundição McCulloch & Co’s Cumberland, situada na Rua Stockwell.
Sua residência estava situada na Circus Park, 22, em Glasgow, Escócia. MacFarlane foi figura proeminente na política local, assumindo a presidência da Associação Liberal de Glasgow e tornou-se vereador da cidade.

Referência: Estação da Luz, em São Paulo, Brasil
Saracen Foundry
MacFarlane, uniu-se Thomas Russell e James Marshall, implantando com eles a sociedade Walter MacFarlane & Co. Ltd em 1850. Eles montaram uma fundição na Alameda Sarraceno, atrás da Passagem Subterrânea Sarraceno, em Gallowgate. Em 1862 o negócio mudou-se por um período para a Rua Washington.
Os negócios expandiram-se, e MacFarlane precisa de um grande terreno para construir uma fundição e uma infra-estrutura com força de trabalho e vila operária. MacFarlane fez um acordo com o filho de Coronel Alexander Campbell de Possil para comprar uma área de 100 hectares (1 ha =10000 m2 = 0,01 km2) na região de Possil em meados de 1860, incluindo a propriedade principal da residência de  Sir Archibald Alison, 1º Baronete e o xerife de Lanarkshire  para construir as instalações da fundição.

MacFarlane supervisionou a remoção de todas as árvores, criando a fundição em 14 hectares, com seus portões principais voltados para a Rua Hawthorn, nº 73.
Depois de criar o acesso à ferrovia para a sua fundição em duplo ramal ferroviário do  North British Railway e o Ramo de Hamiltonhill do Caledonian Railway, MacFarlane tirou o resto da terra do parque fazendo ruas e casas, incluindo a nomeação de rua da frente de sua fábrica de "Rua Sarraceno"
MacFarlane transformou o local de Possilpark, que deixou de ser residência de apenas 10 pessoas em 1872, pasando para 10.000 em menos de duas décadas mais tarde, em 1891. O layout em desenvolvimento de Possilpark foi descrito até então pelo Conselho de cidade de Glasgow como:
"seu trabalho é de uma elegância e de melhor realização em Glasgow, e o novo subúrbio de Possil Park, estabelecidas por eles com habilidade e inteligência, está rapidamente se tornando um complemento importante para a cidade."
Ironicamente, a poluição da fundição de Macfarlane ganhou o apelido de "O Senhor de Fossiltown."

Nova etapa
Integrando o escritório em 1871, o sobrinho de MacFarlane, Walter MacFarlane II (1853-1932), tornou-se sócio em 1880. Sucedendo seu tio, falecido em 1885 e sepultado na Necrópole de Glasgow.  
O jovem MacFarlane resolveu fazer design e normalização como chave para o desenvolvimento da empresa.
Catálogo da Fundição Sarraceno de 1882
Posteriormente, a Fundição Sarraceno passou a produzir um conjunto de projetos padrões, uma série de trabalhos de ferro decorativo, de trilhos, bebedouros, coretos, lâmpadas de rua, edifícios pré-fabricados e conjuntos de características arquitetônicas.  Para atingir o padrão da exigencia dos desenhos idealizados, a empresa empregou os melhores arquitetos de Glasgow, incluindo John Burnet, James A Ewing, James Sellars e Alexander Thomson. James Boucher foram contratados para projetar os quartos da mostra de fundição de Possilpark como uma gigantesca vitrine para os produtos, completados com vidro e cúpula de ferro e fundições decorativas elaboradas no seu portão de estilo gótico. As obras da “Fundição Sarraceno” foram exportadas para todo o Império britânico, e ainda podem ser encontrados em abundância em muitas partes do norte de Glasgow.

Mudanças para o fim
Após a segunda guerra mundial, com o desmoronamento do Império britânico, e a mudança das máquinas a vapor e a adaptação de novos equipamentos e materiais, significaram um grande declínio para projetos de padrão do ferro em moldes da Fundição Sarraceno. 

A empresa da MacFarlane mudou para peças de fundição padrão, tornando-se fornecedora de Sir Giles Gilbert Scott fabricando para os Correios as caixas de telefone, como as clássicas K6, vistas ainda em algumas regiões britânicas. 


Após essa etapa a família MacFarlane tentou reassumir o comando da empresa em 1965, mas os tempos eram outros e houve por bem terminar as atividades, fechando sua portas em 1967. O local de fundição foi parcialmente preservado em sua arquitetura, sendo atualmente ocupada por um número de empresas comerciais.

A Estação da Luz

O Campo do Guaré ou Caminho do Guarepe, termo indígena para definir o campo de “matas em terras molhadas”, era deste modo conhecido devido às cheias dos rios Tamanduateí e Tietê que em tempos de chuvas fortes inundavam a região transbordando em suas margens. Por iniciativa do Barão de Mauá, implantou-se a estação ferroviária da The São Paulo Railway Company, em associação com o capital inglês dos Rothschild, para o escoamento do café proveniente do interior de São Paulo para o porto de Santos, nas terras da antiga Fazenda Sharpe, pertencente a Roberto Sharpe, também denominada de Chácara Mauá. Em 1860 teve início a construção da Estação da Luz.

Fazenda Sharpe ou Mauá
A Estação da Luz foi inaugurada em 16 de fevereiro de 1867 sendo o ponto principal no planalto paulistano da estrada de ferro que ligava Jundiaí a Santos da São Paulo Railway Company. A antiga estação da Luz do século 19 era um local típico de uma estação interiorana, apenas com uma plataforma e uma bilheteria. Completava o projeto da Estação o Jardim já existente inaugurado nas imediações em 1825 que se incorporou a Estação de Luz integrando o arrojo que se pretendia para a capital paulista. 





A arte da Fundição Sarraceno na Estação da Luz / São Paulo

Naquela época a cidade crescia e aflorava imigrantes de todas as partes do mundo e a demanda de passageiros aumentava a cada dia e a produção de carga era grande que necessitava a construção de uma estação que competisse com a demanda de número de pessoas e produção cafeeira. A cidade de São Paulo já exigia um transporte moderno e os bondes elétricos começavam sua expansão em 1900 pela canadense São Paulo Tramway, Light and Power Company.
A Railway com o Tramway

Já estava em construção desde 1895 à nova Estação da Luz, aonde iria “correr” a riqueza do solo paulista e paulistano. A estrutura metálica foi totalmente elaborada na Inglaterra em ferro fundido cinzento de grande resistência a compressão dando sustentação de grandes cargas em peças pré-moldadas de fácil montagem e de fácil transporte. O projeto da nova estação dos primórdios do século 20 esteve a cargo do arquiteto inglês Charles Henry Driver em estilo neoclássico, com semelhanças a uma estação existente em Melbourne, Austrália, conhecida como Flinders Street Station, acrescida com a réplica da torre Westminster, em Londres, onde está instalado o relógio Big Ben, sentido do predomínio econômico da época, do final da Era Vitoriana.
Interior da Estação da Luz/São Paulo

No início do século 20 não havia na arquitetura da cidade de São Paulo nada que comparava a grandeza da “nova” Estação da Luz, uma nova etapa estava por vir com a implantação das ferrovias naquele que seria o maior pólo industrial da América Latina. 

A arquitetura tinha relação com o clássico estilo inglês, solene em uma fachada longa de 157 metros de comprimento na fachada e torre central de 52 metros de altura onde estava um relógio de 3 metros de diâmetro, com toda a semelhança dos prédios que demarcavam o horário da precisão britânica copiado do estilo do Big Ben londrino. 


Toda estrutura da estação propriamente dita, onde iriam circular as locomotivas, eram em forma de arco metálico, que cobria o leito ferroviário, abaixado em 10 metros em relação ao nível da entrada principal da estação, onde estariam as plataformas de embarque e desembarque. 
   
O  material da construção da Estação da Luz foram importados e transportados em módulos para São Paulo em navios cargueiros que trouxeram desde  rebites, tijolos do prédio, madeiras e portas de pinho-de-riga da Irlanda, telhas e cerâmicas de Marselha, França, e a estrutura de aço e peças fundidas de Glasgow, Escócia. Estimou-se à época um custo aproximado de 150 mil libras esterlinas.

A inauguração da “nova” Estação da Luz ocorreu no dia 1º de março de 1901, embora já fosse utilizada antes desta data, tornando-se símbolo da época de ouro do ciclo da alta produção cafeeira da cidade de São Paulo. Consta que não houve solenidade de inauguração, apenas uma aprovação do então Ministro da Viação e Obras Públicas, Epitácio Pessoa, em despacho deferido em 23 de fevereiro de 1901.
Estação da Luz: 1900

Estação da Luz: 2010 - implantação da linha 4 do metrô de São Paulo

Deste modo foi “apresentada” a obra edificada numa área de 752 metros quadrados, símbolo da pujança paulistana. Em um vão livre de 35 metros de treliças fortemente rebitadas a quente em uma altura de 25 metros, cobertos por telhas de zinco, onde as “obras de arte” fundidas pela “Fundição Sarraceno” permanecem vivas no século 21 e dão o estilo da beleza a Estação da Luz, no espaço urbano de São Paulo.



Referências:
Kühl, Beatriz Mugayar. Arquitetura do Ferro e Arquitetura Ferroviária em São Paulo: Reflexões sobre sua Preservação. São Paulo: Fapesp, 1998

1 comentário:

hiszafer disse...

https://memorialdrinkingfountains.wordpress.com/